ADRIANA PAULA DOMINGUES TEIXEIRA

MONOGRAFIA PROCESSO CIVIL PUC MINAS

MONOGRAFIA PROCESSO CIVIL PUC MINAS

 

 

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

  PUC MINAS VIRTUAL

 

 

 

 

 

 

 

 

A DECLARAÇÃO DE OFÍCIO DA PRESCRIÇÃO APÓS O ADVENTO DA LEI NO.11.280/06: repercussão no ato jurídico da renúncia e compatibilidade.

 

 

 

ADRIANA PAULA D. TEIXEIRA

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Rio de Janeiro

2008


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A DECLARAÇÃO DE OFÍCIO DA PRESCRIÇÃO APÓS O ADVENTO DA LEI NO.11.280/06: repercussão no ato jurídico da renúncia e compatibilidade.

 

 

 

 

 

 

 

Monografia apresentada à PUC Minas Virtual, da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de especialista em Direito Processual Civil

Professor Orientador: Magno Federici Gomes

 

 

 

Rio de Janeiro

2008


FOLHA DE APROVAÇÃO

 

 

AUTOR: ADRIANA PAULA DOMINGUES TEIXEIRA

TÍTULO: A DECLARAÇÃO DE OFÍCIO DA PRESCRIÇÃO APÓS O ADVENTO DA LEI NO.11.280/06: repercussão no ato jurídico da renúncia e compatibilidade.

 

 

 

Trabalho de Conclusão de Curso defendido e aprovado em   /11/2008, com NOTA    (   ,  ) pela comissão julgadora.

 

Membros da Banca ???

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

AGRADECIMENTOS

 

 

Agradeço aos meus entes queridos o tempo que lhes foi suprimido, a compreensão e o apoio incondicionais ao longo de mais esta jornada. Aos professores do Curso de Especialização pela dedicação incondicional e por toda a experiência transmitida com coerência, organização e dedicação. Exemplos de profissionais, que tive a honra de compartilhar alguns momentos. Fica, aqui, o singelo registro da minha gratidão. Aos demais colegas de estudo pelas discussões acaloradas ao longo desta trajetória. 


 

 

 

RESUMO

 

 

A criação da prescrição teve por fundamento o interesse público na estabilização do direito, porquanto a sua violação provocava uma instabilidade jurídica, não sendo interessante a perduração deste estado perante a sociedade. A prescrição serve à paz social e de forma reflexa traz benefício ao prescribente devedor. Seu fim não é, assim, proteger o devedor, mas aquele que não sendo se torna pela destruição da prova ao longo dos anos . O instituto remonta à época do Direito Romano. Foi introduzido juntamente com as ações temporárias, nas quais a prescrição deveria ser analisada pelo pretor no início da fórmula. Daí a própria origem etimológica da palavra, traduzindo-se como “escrever antes”. Embora fundamentada na ordem pública a prescrição se aplica a relações privadas, tendo campo fértil nos direitos patrimoniais, especialmente nas pretensões condenatórias. Por isto é que sempre se defendeu a natureza jurídica de exceção para a prescrição como instituto típico do direito material. Embora o seu reconhecimento gerasse efeitos processuais, a prescrição sempre foi abordada em normas de direito material ( Código Civil, Código Penal e Código Tributário), sendo esta uma tradição do direito brasileiro. Neste sentido dispunha o art.194 do Código Civil de 2002 ( Brasil,2002), antes do advento da Lei no.11280/06, que “ o juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se favorecer a absolutamente incapaz.” A única exceção referia-se ao interesse dos absolutamente incapazes, porquanto não tinham capacidade plena. A redação do art.219, parágrafo 5º., do Código de Processo Civil ( CPC), determinada pela Lei no.5.925, de 01/10/1973, estava em harmonia com o Código Civil que entrou em vigor em 11/01/03. Por tal razão, a Lei no.11.280, de 16/02/06, foi inovadora. Sob o pretexto de conferir racionalidade e celeridade à prestação jurisdicional muniu os magistrados de maiores poderes, conferindo-lhes a possibilidade de conhecimento da prescrição de ofício mesmo envolvendo direitos patrimoniais e ainda que sem benefício ao interesse de incapazes. A mesma lei, por absoluta incongruência, acabou por determinar a revogação expressa do art.194, do Código Civil. De aplicação imediata trouxe celeuma no meio jurídico. Pela nova redação do art. 219, parágrafo 5º., do CPC, e pela revogação do art.194, da Lei material se coloca em discussão a disponibilidade efetiva da prescrição pelo prescribente e a própria aplicabilidade e constitucionalidade da modificação introduzida, segundo as regras de hermenêutica e princípios constitucionais como do contraditório. Surge o questionamento dos limites do poder inquisitivo do magistrado e do próprio alcance da finalidade da norma no ponto referente à celeridade, bem como a quem efetivamente a lei serve. Até que ponto a modificação não trará maior instabilidade jurídica com o aumento do tempo médio de duração do processo. Todas estas inquietudes sobre a possibilidade de conhecimento de ofício da prescrição serão abordadas no presente trabalho. Inicialmente foi feita uma exposição sobre o fundamento da prescrição, seus elementos constitutivos e seu objeto, passando-se, por fim, ao enfrentamento da questão de fundo quanto a aplicabilidade da inovação introduzida pela Lei no.11.280, de 16/02/2006 diante da natureza também privada do instituto. Procurou-se buscar uma análise reflexiva sobre o tema, com exposição dos pontos favoráveis e contrários à declaração de ofício da prescrição. A conclusão encaminhou-se no sentido da possibilidade da aplicação da inovação, sem violação do preceito do art.191, do CPC, através da prévia oitiva do credor, a exemplo do que restou regulamentado pela Lei nº11.051/04. O princípio do contraditório também ficaria preservado toda vez que o devedor for regularmente cientificado do resultado do acolhimento inicial da prescrição, ou seja, da extinção do processo, com resolução do mérito (art.269, inciso IV, do CPC).  Outra solução possível é a submissão da matéria ao crivo das partes, competindo a provocação ao magistrado. Assim, ainda que a prescrição deixe de ser um ônus para a parte, mesmo assim preservar-se-ia a sua natureza jurídica de matéria de fato e não de direito. O assunto, contudo, é tormentoso, seja pela sua atualidade, seja pela modificação do próprio sistema legal, o qual goza de presunção de legalidade e validade até prova em contrário construída a partir da declaração de inconstitucionalidade, o que exige um controle direto por meio das Ações Diretas de Inconstitucionalidade ou Constitucionalidade para que tenha um efeito vinculante para todos, não havendo até o presente momento notícia perante o órgão de pesquisa jurisprudencial do Colendo.Supremo Tribunal Federal (STF) de interposição desta medida processual. Nem mesmo a matéria chegou ao conhecimento do guardião da Constituição por intermédio do controle concentrado. Já existem, inobstante, julgados perante o Colendo Superior Tribunal de Justiça reconhecendo a possibilidade da decretação de ofício da prescrição de forma genérica. Diante deste quadro foram lançadas as primeiras impressões, de forma despretensiosa, das soluções possíveis de maneira a preservar a subsistência da renúncia à prescrição após o advento da Lei n° 11.280/06 e de contornar a dicotomia

Palavras-chave: Prescrição. Retroatividade da Lei Prescricional.  Renúncia . Declaração de Ofício.

 


“ABSTRACT”

 

 

SUMÁRIO

 

 

1.INTRODUÇÃO.....................................................................................................................10

2.PRESCRIÇÃO.......................................................................................................................15

2.1.Evolução Histórica..............................................................................................................15

2.2.Classificação.......................................................................................................................16

2.3.Fundamentos.......................................................................................................................

2.4.Elementos.............................................................................................................................                                         

2.5.Objeto...................................................................................................................................

3.DECLARAÇÃO DE OFÍCIO DA PRESCRIÇÃO APÓS O ADVENTO DA LEI  no.11.280/06..............................................................................................................................28

3.1.Distinção entre Prescrição e Decadência............................................................................29

3.2.Exceção Substancial e Objeção...........................................................................................33

3.3.Da Renúncia........................................................................................................................35

3.4.Prescrição Conhecimento Judicial......................................................................................39

4. CONCLUSÕES....................................................................................................................44

REFERÊNCIAS........................................................................................................................46

ANEXOS..................................................................................................................................48

A.

B.

C.

 

 

 

 

 

1 INTRODUÇÃO

 

 

O presente estudo analisará a subsistência da renúncia à prescrição de direitos patrimoniais disponíveis após o advento da Lei nº 11.280, de 16/02/06, que conferiu nova redação ao &5º., do art.219, do CPC, tornando aparentemente incongruente o ato de renúncia do prescribente com a possibilidade de conhecimento de ofício da prescrição .

 Embora o fundamento ou a origem da prescrição seja o interesse público e o fim a paz social pela pacificação e estabilização dos direitos controvertidos, inquestionável a natureza privada da prescrição, posto que regula relações jurídicas entre particulares. Por esta razão até o advento da Lei nº 11.280, de 16/02./06 não pairava dúvida que apenas quem tinha benefício econômico com a  prescrição poderia suscitá-la, sendo subtraído do julgador tal liberdade, ao menos como regra.

Com efeito, o devedor tinha que se valer da exceção, na concepção de meio de defesa, para que o julgador pudesse conhecer da prescrição de direitos patrimoniais. A regra era, portanto, que a prescrição fosse matéria de defesa de mérito, não suscetível de conhecimento judicial de ofício. Neste sentido dispunha o art.219, parágrafo 5º., do CPC , com a redação da Lei nº 5.925, de 01/10/1973: “ Não se tratando de direitos patrimoniais, o juiz poderá, de ofício, conhecer da prescrição e decretá-la de imediato.” (Brasil,1973). Numa interpretação a contrário senso, inferia-se do texto legal a vedação ao conhecimento de ofício da prescrição dos direitos patrimoniais. Em harmonia com o texto da lei processual, o artigo194, do Código Civil de 2002 ( CC), introduzido pela  Lei nº 10.406, de 10/01/ 2002 determinava: “ O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se favorecer a absolutamente incapaz.” (BRASIL, 2002)

Havia, por conseguinte, uma perfeita coerência entre os dois textos legais contemporâneos. Mesmo a exceção prevista no art.194 do CC não tinha o condão de revogar o preceito processual na medida em que dirigida tão somente ao interesse dos absolutamente incapazes. A prescrição era, portanto, matéria de exceção de direito material, que deveria ser suscitada em defesa por meio de prejudicial de mérito. Ao contrário da decadência, envolvia questões de fato, como as causas de suspensão, interrupção e impedimento. Natural, portanto, que tais circunstâncias fáticas fossem suscitadas pela parte interessada, afinal dificilmente seriam do conhecimento a priori do magistrado.

No Código Civil anterior, de 1916 ( CC/16), Lei nº3.071, de 01/01/1916, conservou-se a mesma tradição,  vedando-se ao juiz o poder de decretar de ofício a prescrição. A matéria vinha tratada no art. 166 (CC/16), que dispunha:” O juiz não pode conhecer da prescrição de direitos patrimoniais, se não foi invocada pelas partes.” ( BRASIL,1916).

 O qualificativo de direitos patrimoniais se justificava na redação original do CC/16, isto porque este estatuto legal havia unificado a prescrição e a decadência, incluindo prazos típicos de decadência no mesmo título genérico da prescrição.

Neste sentido é oportuna a transcrição da abordagem histórica do anteprojeto deste Código, realizada pelo eminente jurista Antônio Luís da Câmara Leal ( 1978,p.81):

 

 

Nosso Cód.Civil não fez da impronunciabilidade judicial ex officio da prescrição uma regra absoluta, pois a limita aos direitos patrimoniais, quando diz: “ O juiz  não pode conhecer da prescrição dos direitos patrimoniais, se não foi invocada pelas partes.” Espínola, anotando esse dispositivo, escreve: “Salientam os comentadores a fórmula pouco feliz do artigo, que pode levar a crer que os direitos não-patrimoniais estão igualmente sujeitos à prescrição propriamente dita, a qual, nesse caso, pode ser decretada pelo juiz ex officio. Tem, entretanto, a redação do artigo a sua história e a sua justificação. O projeto primitivo, partindo da distinção doutrinária entre prescrição e decadência, só contemplara, no capítulo destinado a indicar os vários casos de prescrição, as hipótese em que ocorre verdadeira prescrição. E, como os direitos patrimoniais é que se acham sujeitos a perder a garantia por efeito da prescrição propriamente dita, assim redigira o projeto o seu art.201:”As ações que protegem os direitos patrimoniais, extinguem-se por prescrição.” Em seguida, estabelecia os prazos. Quanto à decadência, a que estava submetido o exercício de certos direitos não –patrimoniais, não o regulara aí, mas em seus lugares especiais. A primeira Comissão Especial dos 21 deputados entendeu, porém , na redação final do projeto, de incluir entre os casos de prescrição os de decadência de direitos não –patrimoniais. Já o art.201 do projeto Beviláqua havia desaparecido na revisão da comissão dos 5 jurisconsultos. Mas acontecia que a verdadeira prescrição, no pensamento do legislador, em respeito à tradição doutrinária e à prática jurisprudencial, não poderia ser decretada de ofício pelo juiz, o qual, ao invés, era autorizado a pronunciar a decadência dos direitos não-patrimoniais, sem provocação da parte interessada. Esses princípios não seriam mantidos, se não houvesse modificação nos termos do art.170 do projeto da Comissão Especial da Câmara, assim concebido: “ O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação da prescrição”. Como os casos de decadência estavam unidos aos de prescrição e submetidos à mesma epígrafe-“ –dos prazos da prescrição”-, também aqueles só poderiam ser decretados pelo juiz, se alegados. Para fazer cessar esse estado de coisas, o deputado Barbosa Lima, lembrou-se de apresentar a seguinte emenda ao art.170: Proponho que fique assim redigido:” Art.170- O juiz não pode declarar de ofício as prescrições de direitos patrimoniais.” Tendo parecer favorável da Comissão, passou a figurar na redação final do projeto da Câmara. ( LEAL,1978, p.81)

 

Com idêntico entendimento o eminente jurista Theodoro Júnior  (2007, p.42) esclarece:

 

 

A regra, portanto, era de que apenas quando se tratasse de direitos não patrimoniais ( como nas ações de estado e nas de direito de família) é que a prescrição poderia ser apreciada ex officio. A ressalva se explicava porque essas ações, na verdade, não se sujeitavam à prescrição, mas à decadência. A referência a elas, sob o rótulo de prescrição, apenas se justificava pelo defeito técnico do Código Civil de 1916, que não fazia distinção entre prescrição e decadência, rotulando todos os prazos extintivos como prescricionais. (THEODORO JUNIOR,2007,p.42)

 

 Em outras palavras, a prescrição de direitos não patrimoniais encerrava típicos casos de decadência, daí a possibilidade de conhecimento de ofício pelo julgador, o que não abalava a natureza de exceção da prescrição ( exceptio praescriptionis).  

A doutrina demonstra que a prescrição antes da inovação da Lei nº 11.280, de 16/02/06, sempre foi tratada como exceção e não objeção. Registra-se, para este efeito, o abalizado endosso doutrinário do jurista Vilson Rodrigues Alves:

 

Em verdade, a praescriptio (sic) sempre foi exceptio. Transcurso o prazo fixado na regra jurídica para o exercício da pretensão de direito material,, apaga-se ou pode-se apagar sua possibilidade no devir. A pretensão, que é exigibilidade, torna-se ou pode tornar-se inexigível, sem se extinguir. (...) O Código de Processo Civil, art.219, § 5º, com a redação dada pela Lei nº 11.280, de 16 de fevereiro de 2006, art.3º, ao apagar a limitação da cognoscibilidade da prescrição que se estatuía no Código Civil, art.194, 2ª parte ( verbo, “ o juiz pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, se favorecer a absolutamente incapaz.”), eliminou a regra jurídica de impossibilidade do conhecimento judicial ex officio da prescrição. ( ALVES,2008.p.103-566).

 

 

Neste sentido, colhe-se também a opinião do jurista Theodoro Júnior:

 

Milenar ( porque remonta ao direito romano) é a conceituação da prescrição como uma defesa que o devedor tem a faculdade de opor ao credor, para se furtar à pretensão deste a uma prestação cuja exigência permaneceu inexercida por longo tempo. (...) Por conseqüência dessa sábia, mas penosa, distinção, o direito material ( plano de onde se origina tanto a prescrição com a decadência) sempre considerou a prescrição como insuscetível de aplicação ex officio pelo juiz ( Código Civil de 1916, art.166; Código Civil de 2002, art.194), ao contrário da decadência, que,estabelecida por lei, deverá sempre o juiz conhecê-la, de ofício ( Cód.Civil,2002,art.210). Além da diferença substancial entre extinção da pretensão (actio) e extinção do direito (ius), havia uma razão prática para que a prescrição ( ao contrário da decadência) não pudesse ser aplicada de oficio pelo juiz: nunca esteve esta causa extintiva subordinada à rigidez do decurso de um prazo legal, que fosse fatal e inflexível, pois sempre a lei estatuiu uma série numerosa de situações que permitiam, em defesa do credor, interromper ou suspender a prescrição. Como, então, conferir ao juiz sua decretação ex officio, antes da manifestação do titular da pretensão, se somente este está em condições de invocar e demonstrar a ocorrência de alguma causa de interrupção ou suspensão da possível prescrição ? (THEODORO, 2007,p.44-45)

 

 

Ainda, nesta linha de pensamento, ressalta a jurista Maria Helena Diniz:

 

 

É a prescrição uma preliminar de mérito. A pretensão é, pois, o direito de exigir em juízo a obrigação do inadimplente, do dever legal ou contratual;junto com ela nasce a ação ( em sentido material) para obter a prestação da tutela jurisdicional a que faz jus o titular do direito violado ou ameaçado ( CF,art.5º, XXXV). A exceção é meio de defesa indireta para resistir ao exercício daquela pretensão do autor contrapondo um benefício ao réu (p.ex.,exceção de contrato não cumprido, retenção por benfeitoria, prescrição), logo, não nega direito material do autor;visa sua neutralização.  (DINIZ,2005,p.375)

 

Mesmo após o advento da Lei °11.280, de 16/02/06 perdura a defesa da natureza jurídica de exceção substancial da prescrição. Defendem esta tese Flávio Cheim Jorge, Fredie Didier Júnior e Marcelo Abelha Rodrigues, conforme trecho de obra, que ora se transcreve:

 

 

A regra ora comentada é puramente processual. A prescrição não perdeu a natureza de exceção substancial. Alterou-se o regramento processual da prescrição, que, embora uma exceção substancial, tem regime jurídico de objeção. Não vemos qualquer obstáculo teórico a isso. A possibilidade de conhecimento ex officio da prescrição é uma opção legislativa, e não uma exigência teórica. (JORGE, DIDIER, RODRIGUES, 2006, p,40)

 

 

 

Em idêntico diapasão a jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado ,

 bem como do E. Tribunal , conforme julgados abaixo transcritos:

Talvez em razão disto a Lei nº 11.280/06 tenha sofrido pesadas críticas por conta da inversão desta natureza sem nenhum amparo na tradição histórica do instituto .

Destaca Sérgio Pinto Martins a justificativa apresentada pelo Poder Executivo para o Projeto da referida Lei :

 

 

 Sob a perspectiva das diretrizes estabelecidas para a reforma da Justiça, faz-se necessária a alteração do sistema processual brasileiro com o escopo de conferir racionalidade e celeridade ao serviço de prestação jurisdicional, sem, contudo, ferir o direito ao contraditório e à ampla defesa. (...) No mesmo sentido, louvável a disposição que permite ao juiz decretar de ofício, sem necessidade de provocação das partes, a prescrição, em qualquer caso, conforme proposta de redação inédita ao &5º., do art.219 do CPC.(MARTINS,2006) 

 

Assim, sob a bandeira da celeridade e efetividade do processo, o legislador pretendeu conferir ao julgador amplos poderes para que pudesse conhecer da prescrição no início da ação,  sem maiores delongas.

O jurista Alexandre Freitas Câmara (CÂMARA, 2008) chega a cogitar que, dentre as razões para a reforma, estaria o interesse da Fazenda Pública, cuja estrutura operacional deficiente obsta a alegação tempestiva da prescrição pelos Procuradores, com prejuízo ao Erário.

Inobstante a divergência quanto a real finalidade da reforma, esta apenas será atingida dependendo da forma como os Tribunais a interpretarão e aplicarão.

O que se buscou com o presente trabalho foi identificar os problemas advindos desta modificação, com especial enfoque para a questão da renúncia da prescrição pelo prescribente e a falta de coerência da modificação realizada pela via processual com o texto do direito material, gerando uma falta de sistematização entre as normas  dos dois ramos do Direito. Posteriormente, foram destacadas algumas possíveis soluções para a harmonização dos interesses conflitantes, de maneira que o fim da norma não fosse desvirtuado.

Será adotado com predominância o método indutivo, utilizando-se a pesquisa bibliográfica, com a utilização da doutrina, sob a forma de consulta a livros e artigos jurídicos, além da jurisprudência. O marco teórico será a clássica obra sobre Preescrição e Decadência  de Antônio Luís da Câmara Leal.

No primeiro capítulo serão abordados temas relevantes da prescrição, como a natureza jurídica, fundamentos, elementos e objeto para que se possa evoluir para o segundo capítulo, onde será abordada a matéria específica, referente à compatibilidade do direito de renúncia da prescrição com a possibilidade de conhecimento de ofício desta a partir da modificação genérica implementada pela Lei nº 11.280/06. Neste caminho serão analisados os elementos de diferenciação entre a prescrição e a decadência , a natureza histórica de exceção substancial, a renúncia, o conhecimento judicial da prescrição, o momento deste conhecimento, antinomia jurídica e os critérios para a solução dos conflitos de normas. Por fim, serão tecidas as conclusões finais.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

2. PRESCRIÇÃO

 

 

Neste capítulo será feita uma abordagem histórica sobre a prescrição, da origem etimológica da palavra até a atualidade contemporânea, com a identificação dos textos legais e principais elementos característicos deste instituto para melhor clareza da inovação introduzida pela Lei °.11.280/06.

 

 

2.1. Evolução Histórica

 

 

Para Leal (1978)  é a partir do direito romano que se compreende o significado da palavra prescrição,  oriunda do substantivo latino praescriptio derivado do verbo praescribere, traduzindo-se como “escrever antes”.

Nos primeiros tempos do direito romano, as ações eram perpétuas. Foi com o sistema formulário do direito pretoriano que surgiu o conceito de prescrição pelo advento das ações temporárias.  Ao pretor cabia a escolha do juiz que, em cada litígio, julgava de acordo com a orientação previamente traçada na fórmula.

O jurista Antônio Luis da Câmara Leal descreve em sua obra as etapas deste processo, escrevendo::

 

Essa fórmula, em cujo frontispício era feita a instituição do juiz, compunha-se de quatro partes principais: a demonstratio, ou enunciação da parte não contestada dos fatos da causa; a intentio, ou indicação da pretensão do autor e contestação do réu; a condemnatio, ou atribuição conferida ao juiz para condenar ou absolver, segundo o resultado de sua verificação; e a adjudicatio, ou autorização concedida ao juiz para atribuir às partes a propriedade do objeto litigioso. (LEAL,1978,p.3)

 

Assim, ao estabelecer a fórmula o pretor incluía nesta uma parte introdutória nas ações temporárias em que era absolvido o réu, caso extinto o prazo de duração da ação. Esta parte inicial, que antecedia a própria fórmula, dava-se o nome de prescrição. Em que pese o termo não se relacionar diretamente com o conteúdo da determinação do pretor, acabou por se identificar com este, passando a traduzir a extinção ou perda da ação pelo término do prazo de duração desta.

Ainda sobre a origem do instituto Leal disserta:

 

Tendo a Constituição Teodosiana abolido a perpetuidade das ações oriundas do jus civile, estabelecendo o prazo de trinta anos para extinção de todas as ações, que não tivessem menor prazo de duração, ficou o possuidor, com posse trintenária, investido de exceção prescricional contra a reivindicatória do proprietário, independentemente de justo título e boa fé, donde a praescriptio longissimi temporis, como causa extintiva das ações de reivindicação.  (1978,  p.5)

 

Até a época de Justiniano o usucapião, forma aquisitiva da propriedade, e a prescrição denominada longi  et  longissimi temporis, meio extintivo da ação reivindicatória, eram tratados de forma distinta. Foi com Justiniano que ocorreu a unificação dos dois institutos, atribuindo-se à longa duração da posse extintiva da ação reivindicatória o mesmo efeito do usucapião. A prescrição passou a ser causa de aquisição da propriedade e de extinção das ações.

No Brasil o instituto foi previsto em todas as Ordenações. Nas Ordenações Filipinas, o Livro IV, Título 79 atribuía o caráter de penalidade à prescrição, dispondo o texto legal que “ pela negligência, que a parte teve de não demandar em tanto tempo sua coisa, ou divida, havemos por bem, que seja prescrita a ação , que tinha para demandar.”

Foi também reproduzida no Código Civil de 1916 e no atual ( 2.002).

No Código Civil de 1916 ( Lei no.3.071, de 01 de janeiro de 1916) a prescrição foi tratada no Título III, em quatro capítulos, integrando a Parte Geral do Código. Foi-lhe atribuída a natureza de exceção, que deveria ser invocada pelas partes.

No Código Civil de 2002, introduzido pela Lei no.10.406, de 10/01/2002, a prescrição foi incluída no Título IV  e no Livro III, dos Fatos Jurídicos. Merecem destaques os arts. 189, 191 e 194, com a redação original, os quais dispunham:

 

 

Art.189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts.205 e 206.

 

 

Art.191. A renúncia da prescrição pode ser expressa ou tácita, e só valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se consumar; tácita é a renúncia quando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição.

 

 

Art.194. O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se favorecer a absolutamente incapaz. ( CÓDIGOS,2007)

 

Com o art.194 do Código Civil de 2002  veio a possibilidade do juiz conhecer de ofício a prescrição de direitos patrimoniais, quando favorecesse o interesse dos absolutamente incapazes A partir desta inovação, que teve por alicerce o fato da impossibilidade de renúncia pelo incapaz da prescrição, formou-se o convencimento que o art.219, &5º., do CPC teria sido derrogado pela redação do art.194 do Código Civil.

 Embora instituto típico do direito material, foi também abordado pelos Códigos de Processo Civil ante aos efeitos da prescrição no processo, conseqüências,  momento da sua argüição e  partes legitimadas a fazê-lo.

O Código de Processo Civil de 1939 ( BRASIL,1939) a tratou como forma de extinção do processo com julgamento do mérito, sendo –lhe atribuída a natureza de exceção processual, dependendo da iniciativa das partes para que o julgador pudesse dela conhecer.

No Código Civil de 1973 ( CÓDIGOS,2007) a prescrição foi regulamentada no art.269, inciso IV, como uma das hipóteses de resolução do mérito da causa. Continuou-se a defender a natureza jurídica de exceção, consoante redação original do art.219, &5º., que dispunha:

     o art.219, &5º., do CPC, com a redação da Lei no.5.925, de 01/10/1973: “ Não se tratando de direitos patrimoniais, o juiz poderá, de ofício, conhecer da prescrição e decretá-la de imediato. ( CÓDIGOS,2007)

 

Posteriormente, com o advento da Lei no. 11.280, de 16 de fevereiro de 2006 ( BRASIL,2006), houve uma profunda alteração neste estandarte, com a possibilidade de conhecimento da prescrição de ofício pelo julgador, passando o texto do art.219, &5º., do CPC, a apresentar a seguinte redação:” O juiz pronunciará , de ofício, a prescrição.”

A referida Lei por absoluta incompatibilidade com o preceito do artigo 194 da Lei material determinou a sua expressa revogação, rompendo com uma tradição histórica sem uma evolução científica que pudesse justificar ou legitimar a mudança.

 

 

2.2. DA CLASSIFICAÇÃO, FUNDAMENTOS, CONDIÇÕES E OBJETO DA PRESCRIÇÃO

 

 

A prescrição pode ser classificada como Ato-fato jurídico. Influenciam a sua ocorrência não apenas fatores naturais como o decurso do tempo, mas elementos humanos como a negligência do credor  em realizar a defesa de um direito que lhe é próprio.

O jurista Vilson Rodrigues Alves (2008) defende esta classificação. Argumenta que a mera inclusão da prescrição como fato jurídico mostra-se por demais genérica. Justifica a sua classificação na condensação de ato humano negativo e elemento extra-humano-tempo. Daí o conceito de ato-fato, sendo que o atributo jurídico decorre da relevância para o mundo do direito.

Prevalece, contudo, na doutrina a classificação da prescrição como fato jurídico.

Aliás, foi esta a posição que prevaleceu no Código Civil de 2002, onde a prescrição foi incluída no Livro III intitulado dos Fatos Jurídicos, sendo tratada em título próprio ( Título IV – Da Prescrição e da Decadência) . Não se inseriu na modalidade de negócio jurídico e nem de atos jurídicos. No Código Civil de 1916 teve idêntico tratamento ( inserida em Título próprio incluído no Livro dos Fatos Jurídicos).

Muito se discutiu sobre o fundamento jurídico da prescrição, sendo destacados, como principais, o do castigo ou sanção à negligência do credor, que faria presumir pela renúncia da prescrição; o da proteção do devedor; o da redução das demandas e o do interesse social pela estabilidade das relações jurídicas.

De acordo com Leal ( 1978,p.14) “na origem romano do instituto eram apontados três fundamentos: “o da necessidade de fixar as relações jurídicas incertas, evitando as controvérsias; o do castigo à negligência e o do interesse público”.

Atualmente não pairam mais dúvidas que o fim e fundamento da prescrição são o interesse público e a pacificação dos conflitos, não sendo aceitável que litígios sejam eternizados pela inércia de seu titular em defendê-los. Isto seria nocivo à segurança jurídica das relações sociais, porquanto a qualquer momento o devedor poderia ser chamado a provar uma dívida, cuja prova da quitação  poderia sucumbir com o tempo.  Estar-se-ia legitimando pelo tempo uma cobrança indevida pelo desaparecimento da prova da quitação.

Aludindo ao fundamento da prescrição escreveu Leal:

 

 O não cumprimento de uma obrigação, a ameaça ou violação de um direito são estados antijurídicos que perturbam a harmonia social, e a ação foi instituída como meio reintegratório dessa harmonia, fazendo cessar o desequilíbrio provocado pela ofensa ao direito. Se o titular deste, porém, se conserva inativo, deixando de protegê-lo pela ação, e cooperando, assim, para a permanência do desequilíbrio antijurídico, ao Estado compete remover essa situação e restabelecer o equilíbrio, por uma providência que corrija  a inércia do titular do direito.. (1978,p.15)

 

Destaca, ainda, o jurista ( LEAL, 1978,p.16):

 

Aí estão os três fundamentos romanos da prescrição: o interesse público, a estabilização do direito, o castigo à negligência; representando o primeiro o motivo inspirador da prescrição; o segundo, a sua finalidade objetiva; o terceiro, o meio repressivo de sua realização. Causa, fim e meio, trilogia fundamental de toda instituição, devem constituir o fundamento jurídico da prescrição.

 

Eis a descrição do interesse público no instituto e o caráter público da norma referente à prescrição. Inobstante, a norma também apresenta uma natureza privada na medida em que regula relações jurídicas de ordem privada, com o sacrifício de um direito individual.

Desta natureza híbrida resulta, segundo Leal (1978,p.19), “ dois fenômenos antagônicos”, de muita relevância para a compreensão do conflito atual decorrente do advento da Lei no.11.280/06. Como norma pública apresenta efeito retroativo, sendo de aplicação imediata a nova lei, atingindo a prescrição em curso. Contudo, como norma privada, admite-se a sua renúncia pelo prescribente uma vez consumada. O direito é renunciável, ou seja, o interesse das partes pode neutralizar os efeitos legais da norma.

Para a consumação da prescrição os juristas são harmoniosos na descrição de quatro elementos ou condições da prescrição, quais sejam: existência de uma ação exercitável; inércia do titular da ação pelo seu não-exercício; continuidade dessa inércia durante um certo lapso de tempo e  ausência de causas preclusivas de seu curso.

Caio Mário da Silva Pereira (1978,p.590) destaca “que a prescrição é resultante do tempo aliado a outros fatores como a inércia e negligência do titular, que permite a outrem a negação prática da relação jurídica durante um certo lapso temporal.”

Para Vilson Rodrigues Alves (2008) a regra jurídica do art.189, do Código Civil vigente não exige a cognição pelo titular da pretensão ou do próprio direito, como pressuposto para a contagem do prazo de prescrição. Alega que a prescrição não tem o seu curso interrompido ou suspenso contra os relativamente incapazes a certos atos ou com relação aos sucessores. As únicas exceções para o jurista seriam a existência de regra jurídica específica ou quando o conhecimento seja imprescindível para o início da prescrição, quando a violação do direito não fosse possível de ser conhecida de forma imediata pelo titular do direito.  Cita, como exemplo, a pessoa contaminada pelo vírus HIV após transfusão de sangue em hospital da rede pública. Neste caso a prescrição à pretensão de direito material condenatória contra o Estado se iniciaria do conhecimento do fato pela vítima e não do procedimento médico da transfusão. 

A primeira das condições da prescrição é a existência de uma ação exercitável, fato que apenas ocorre a partir do momento da violação de um direito. O desuso de um direito durante um lapso temporal não dá início à prescrição. Esta pressupõe a existência de um estado contrário a este uso. Por isso o jurista Antônio Luis da Câmara Leal  (1978, p.21) declara que:

 

 enquanto nenhuma perturbação sofre o direito , nenhuma ação existe que possa ser posta em atividade pelo seu titular. Ora, sendo o objetivo da prescrição extinguir as ações, ela só é possível desde que haja uma ação a ser exercitada, em virtude da violação do direito. Daí a sua primeira condição elementar: existência de uma ação exercitável ; è a actio nata dos romanos.

 

O segundo elemento caracteriza-se como a inércia do titular da ação. Ou seja, a situação estática, de apatia diante da violação de um direito que lhe é próprio. A inércia só tem relevância jurídica a partir da violação do direito e do nascimento da ação como direito subjetivo à tutela estatal.

O terceiro elemento cuida da continuidade da inércia durante o prazo fixado na norma para o exercício da ação. O intuito da norma não é punir a inércia momentânea, mas a prolongada, que caracteriza o desleixo, a negligência.

   O quarto elemento é a ausência das causas de imunidade à prescrição, que obstam o início do prazo de prescrição ( causa impediente do curso do prazo prescricional), como , por exemplo, os absolutamente incapazes do art.3º., do CC. As que suspendem o curso desta, quando já iniciada a prescrição e as que a interrompem , quando uma vez iniciada a norma determina a paralisação e recontagem integral do prazo após o desaparecimento da causa de interrupção. O atual Código Civil , assim como o anterior, não primou pela melhor técnica ao elencar os casos de impediência, de suspensão e interrupção. Os arts.197,198 e 199, do Código Civil vigente declaram, sem especificar o que seria causa de impedimento e suspensão “, que não corre a prescrição”.

Inobstante,  verificada umas das condições previstas nas normas, a prescrição não se inicia ou tem o seu curso suspenso ou interrompido, dependendo se a pretensão nasceu depois ou antes dos fatos referidos pelos arts.197-198 do Código Civil.

Considerando o objeto do presente trabalho não serão analisados, de forma pormenorizada, os casos de impedimento, suspensão e interrupção do prazo prescricional, sendo suficiente para a compreensão da temática proposta o estudo realizado.

Por fim, no que tange ao objeto da prescrição, há grande divergência doutrinária. Os civilistas alemães consideram as ações como o objeto da prescrição. Já os franceses e italianos tomam por objeto da prescrição o direito. No Brasil prevaleceu a corrente tedesca.

Neste sentido, destaca Leal em sua obra:

 

 

Historicamente a prescrição foi introduzida no sistema pretoriano como uma exceção oposta ao exercício da ação e tinha por fim extingui-la. O direito, porém, podia sobreviver à extinção da ação. (...) Se a inércia é a causa eficiente da prescrição, esta não pode ter por objeto imediato o direito, porque o direito, em si, não sofre extinção pela inércia de seu titular. O direito, uma vez adquirido, entra, como faculdade de agir ( facultas agendi), para o domínio da vontade de seu titular, de modo que o seu não –uso, ou não exercício é apenas uma modalidade externa dessa vontade, perfeitamente compatível com sua conservação. E essa potencialidade, em que se mantém pela falta de exercício, só poderá sofrer algum risco e vir  a atrofiar-se, contra a possibilidade de seu exercício a todo momento, se opuser alguém, procurando embaraçá-la, ou impedi-la, por meio de ameaça ou violação. É então que surge uma situação antijurídica, perturbadora da estabilidade do direito, para cuja remoção foi instituída a ação, como custódia tutelar. É contra essa inércia do titular, diante da perturbação sofrida pelo seu direito, deixando de protegê-lo, ante a ameaça ou violação, por meio da ação, que a prescrição se dirige, porque há um interesse social de ordem pública em que essa situação de incerteza e instabilidade não se prolongue indefinidamente. (1978,p.9)

 

Inobstante, o tema sempre se mostrou, como em quase tudo que se refere à prescrição, polêmico. O saudoso civilista Caio Mário da Silva Pereira (1978) entendia que a prescrição atingia o próprio direito, porquanto não era possível conceber a subsistência de um direito sem garantir os meios para exercê-lo de forma plena. Defendia o direito como o objeto da prescrição, argumentando:

 

 Esdrúxulo se nos afigura, entretanto, que o ordenamento legal reconheça o direito, afirme a sua vinculação ao sujeito ativo, proclame a sua oponibilidade ao sujeito passivo, mas recuse os meios de exercê-lo eficazmente. Se o direito é reconhecido, não deve ser desvestido do poder da rem persequendi iniudicio. Com o perecimento da ação, extingue-se efetivamente o próprio direito, pois, na verdade, e já o explicamos, a ação é um elemento externo do direito subjetivo que toma corpo à vista de qualquer lesão. O direito perde a faculdade de se fazer valer, e qualquer atentado o atinge até a essência, restando sem poder defensivo, porque não é direito sobrevivo;porque se extingue. (1978, p.590) 

 

Diante da autonomia e abstração do direito de ação com o direito material controvertido, passou-se a admitir que o objeto da prescrição não é o direito, ou a ação , sob o enfoque processual, mas a pretensão, porquanto ainda que prescrita a ação não há como se deixar de reconhecer que ação sob o ponto de vista processual houve e foi devidamente exercitada. Outro fator determinante refere-se à própria natureza de direito material da prescrição, tanto que o efeito desta no processo é a sua extinção, com resolução do mérito ( art.269, inciso IV, do CPC).

Humberto Theodoro Junior  relata a evolução histórica do objeto da prescrição:

 

Milenar (porque remonta ao direito romano) é a conceituação da prescrição como uma defesa que o devedor tem a faculdade de opor ao credor, para se furtar à pretensão deste a uma prestação cuja exigência permaneceu inexercida por longo tempo. Já ao tempo de Justiniano, quando a evolução do direito romano atingiu o seu ápice, a prescrição do direito afetava, isto sim, a ação, sob condição, porém, de que o demandado a invocasse: “ La prescrizione dell`azione doveva essere opposta dal convenuto in via dèccezione, e non era quindi rilevabile d `ufficio. Secular, outrossim, tem sido o esforço para distinguir a decadência da prescrição, tendo o direito alemão e suíço ( seguido por vários Códigos Civis modernos, inclusive o brasileiro) logrado a vitória de colocar a prescrição no terreno da extinção da pretensão e a decadência, no da extinção do próprio direito subjetivo.(2007, p.44).

 

Para o jurista (JÚNIOR,2007)  o objeto da prescrição adotado no novo Código Civil  é a pretensão, que representa o conceito civilista do direito de ação, eleito pela tradição do direito germânico e suíço e também adotado em outros Códigos modernos como o do Peru ( de 1984), o do Uruguai (compilado em 1994) e o de Quebec ( de 1991).

  Conceitua a prescrição como “ a posição subjetiva de poder exigir de outrem alguma prestação positiva ou negativa.” (JÚNIOR apud Miranda,2007,p.48).

 

Esclarece, ainda, o jurista:

 

Tem pretensão o titular de obrigação de prestar coisa ou soma de dinheiro, vencida e não cumprida pelo devedor. Não a tem, contudo, o titular de direito potestativo, como o de anular o contrato viciado, já que não depende de prestação alguma de outrem para atingir o intento correspondente a seu direito subjetivo. (JUNIOR,2007,p.48)

 

O art.189, do Código Civil vigente, introduzido pela Lei no.10.406, de 10 de janeiro de 2002, estabelece:“Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts.205 e 206 “

 

Assim, o Código Civil reconheceu a pretensão como o objeto da prescrição.

Segundo Júnior (2007) a lei teria sido simplista ao afirmar que a prescrição extingue a pretensão pelo decurso do tempo. Para este não é a prescrição que extingue a pretensão, mas a sua alegação através da exceção. Logo, o que inibe a pretensão é a exceção, que neutraliza os efeitos daquela. Argumenta em defesa do seu entendimento o fato da renúncia da prescrição ocorrer no processo posteriormente à sua consumação. Alega, ainda, que a dívida prescrita não enseja a devolução do valor voluntariamente quitado e nem sequer teria sentido em se falar de renúncia à prescrição, se nada mais existisse.

De acordo, ainda, com o jurista a alegação da prescrição, através da exceção, ensejaria a inibição da pretensão e não propriamente a sua extinção. Neste sentido, conclui:

 

A prescrição , porém, não extingue o direito subjetivo material  da parte credora. Cria apenas para o devedor uma exceção, que, se for usada no processo de realização da pretensão do credor, acarretará a inibição desta. Se não exercitada a exceção, o direito do credor será tutelado normalmente em juízo, sem embargo de consumada a prescrição. E mesmo depois de a exceção ter sido acolhida, se o devedor efetuar o pagamento da prescrição devida, ou renunciar aos efeitos da prescrição já operada, tudo se passará como se o direito do credor jamais tivesse sido afetado pelo efeito prescricional. (JUNIOR 2007, p.51)

 

No mesmo sentido opina o jurista Vilson Rodrigues Alves:

 

Ora, a prescrição nunca foi nem é causa de aquisição de direito, pretensão e ação por exercício de seu conteúdo, dita “prescrição aquisitiva”, como nunca foi nem é causa de perda de direito, pretensão e ação por não-exercício de seu conteúdo, dita “prescrição extintiva”, em que pese a menção a isso, também na jurisprudência. Em verdade , a praescriptio sempre foi exceptio. Transcurso o prazo fixado na regra jurídica para o exercício da pretensão de direito material, apaga-se ou pode-se apagar sua possibilidade no devir. A pretensão, que é exigibilidade, torna-se ou pode tornar-se inexigível, sem se extinguir. (...) Essa eficácia da pretensão é a exigibilidade do conteúdo do direito de que ela se irradia. Ocorrida a prescrição, apaga-se ou pode apagar-se a possibilidade dessa exigência e nasce na segunda hipótese a exceção de prescrição, alegável pela pessoa a quem favorece, de regra o legitimado passivo. (2008,p.103)

 

Há, contudo, divergência doutrinária quanto a este entendimento.

 

Antônio Luís da Câmara Leal (1978) objeta-se a este entendimento ao tratar da renúncia da prescrição em sua obra clássica sobre a Prescrição e a Decadência, declarando:

 

  que a prescrição existe e opera o seu efeito liberatório, ou extintivo da obrigação, desde que se consuma, pela expiração do prazo prescricional. A invocação dela em juízo é apenas uma afirmativa de que ela existe, e não uma condição de sua existência. Consumada a prescrição, torna-se adquirida, como a denomina o direito francês, e passa a representar um direito atual do prescribente, invocada porque existe, e não existe porque é invocada.” (LEAL,1978, p..55)

 

Em que pese a divergência doutrinária o Código Civil de 2002 elegeu como objeto da prescrição a pretensão, declarando como efeito daquela a extinção desta, consoante o texto da norma do art.189 do referido Estatuto legal.

 

 

3. DECLARAÇÃO DE OFÍCIO DA PRESCRIÇÃO APÓS O ADVENTO DA LEI No.11.280/2006

 

 

O presente capítulo analisará as alterações implementadas no art.219, &5º., do CPC, pela Lei no.11.280, de 16.02.2006, que tratou da prescrição no âmbito processual, seus efeitos e repercussões na natureza do instituto. Posteriormente, examinar-se-á de que maneira se poderá defender a subsistência do ato jurídico de renúncia ante a previsão legal da decretação de ofício da prescrição,  harmonizando-se a inovação com princípios constitucionais, como o do contraditório.

 

 

3.1. DISTINÇÃO ENTRE PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA

 

 

Historicamente a prescrição foi tratada como uma exceção oposta ao exercício do direito de ação, argüível pelo devedor, réu na ação, diferenciando-se da decadência por esta particularidade.  Em outras palavras, a mera consumação da prescrição na obstava a pretensão do Autor. Para que isto ocorresse o devedor deveria suscitá-la por meio de exceção, ocasião em que os efeitos da pretensão ou sua eficácia eram neutralizados. Isto se sucedia pelo fato da decadência não apresentar, em regra, causas de imunidade, tendo por objeto o próprio direito. Não havia, por conseguinte, a necessidade do conhecimento pelo magistrado de situações de fato, como na prescrição.

 Quanto aos traços distintivos entre prescrição e decadência o jurista Humberto Theodoro Júnior, assim se expressa:

 

 Secular, outrossim, tem sido o esforço para distinguir a decadência da prescrição, tendo o direito alemão e suíço ( seguido por vários Códigos Civis modernos, inclusive o brasileiro) logrado a vitória de colocar a prescrição no terreno da extinção da pretensão, e a decadência, no da extinção do próprio direito subjetivo. (2006,p.44)

 

Para Leal (1978) a decadência e a prescrição têm como elementos comuns a inércia e o tempo ,diferenciam-se pelo objeto, pelo início e pela diversidade de natureza do direito que se extingue. Fazendo alusão a estes elementos diferenciadores ensina:

 

Para nós, que adotamos o critério da escola alemã, entendendo que a prescrição extingue diretamente as ações e só, indiretamente, os direitos, a dificuldade se adelgaça, e encontramos, desde logo, o primeiro traço diferencial entre a prescrição e a decadência: a decadência extingue, diretamente, o direito, e, com ele, a ação que o protege; ao passo que a prescrição extingue, diretamente, a ação,e, com ela, o direito que protege. A decadência tem por objeto o direito, é estabelecida em relação a este e tem por função imediata extingui-lo; a prescrição tem por objeto a ação, é estabelecida em relação a esta, e tem por função imediata extingui-la. A decadência é causa direta e imediata de extinção de direitos; a prescrição só os extingue mediata e indiretamente. O segundo traço diferencial vamos encontrá-lo no momento de início da decadência e o momento de início da prescrição, pois, se a decadência começa a correr, como prazo extintivo, desde o momento em que o direito nasce, a prescrição não tem o seu início com o nascimento do direito, mas só começa a correr desde o momento em que o direito é violado, ameaçado ou desrespeitado, porque nesse momento é que nasce a ação, contra a qual a prescrição se dirige. O terceiro traço diferencial se manifesta pela diversidade de natureza do direito que se extingue: a decadência supõe um direito que, embora nascido, não se tornou efetivo pela falta de exercício; ao passo que a prescrição supõe um direito nascido e efetivo, mas  que pereceu pela falta de proteção pela ação, contra a violação sofrida. (LEAL,1978,p.100)

 

O código Civil de 1916 não fazia distinção entre a prescrição e a decadência, tratando todos os prazos extintivos como prescricionais. Exatamente por esta razão permitia o conhecimento de ofício pelo magistrado da prescrição, quando referente a direitos não patrimoniais, na medida em que se tratava de verdadeiros casos de decadência sob a roupagem de prescrição. Daí a utilização do termo “prescrição de direitos patrimoniais” na redação do art. 166, deste Código (BRASIL, 1993), que preconizava: “Art.166. O juiz não pode conhecer da prescrição de direitos patrimoniais, se não foi invocada pelas partes.”

Da distinção clássica entre os conceitos de prescrição e decadência era pacífico o entendimento que apenas a decadência e a prescrição de direitos não patrimoniais, que apresentavam as mesmas características dos decadenciais, poderiam ser declaradas de ofício. A prescrição de direitos patrimoniais exigia uma iniciativa do devedor, porque envolviam situações de fato e não apenas de direito.  O juiz, na maioria das vezes, não tinha condições de conhecê-las. A única exceção ao conhecimento de ofício veio posteriormente com o advento do Código Civil de 2002, referindo-se aos direitos dos absolutamente incapazes (art.194, com a redação original), justificando-se a exceção no fundamento da impossibilidade de renúncia por estes da própria prescrição.

Sensível às controvérsias quanto aos elementos diferenciadores dos dois institutos, Alves relata:

 

 (...) a Comissão Elaboradora e Revisora do Código Civil brasileiro de 2002 deliberou adotar fórmula que entendeu espancar quaisquer dúvidas compossíveis para a distinção dos institutos”. Assim, de acordo com o Supervisor dessa Comissão, “prazos de prescrição, no sistema do Projeto, passam a ser, apenas e exclusivamente, os taxativamente discriminados na Parte Geral, Título IV, Capítulo I (1986,1990), enquanto caracterizariam prazos de caducidade todos os demais, tanto na Parte Geral como quanto na Parte Especial. (2008,p.32)

 

Inobstante, adverte Alves (2008), a finalidade não foi alcançada, porquanto não tardaram posicionamentos em contrário a esta distinção na doutrina com a afirmação de que na Parte Especial do Código também existiam prazos típicos de prescrição e não de decadência.

 No campo da jurisprudência a incerteza jurídica quanto a estes conceitos ainda perdura, com decisões conflitantes sobre casos idênticos pela diversidade de interpretações quanto ao que seriam os prazos decadenciais e os prescricionais.

Com a preocupação do direito contemporâneo em conferir maior liberdade ao juiz, como meio de solucionar o problema da morosidade na solução dos conflitos, os elementos diferenciadores clássicos identificados pelos juristas passaram a ser insuficientes para a diferenciação prática entre casos de decadência e de prescrição. Isto porque com a Lei no.11.280/06 o que era exceção tornou-se regra. Desta feita, a distinção de que a decadência poderia ser conhecida de ofício, ao passo que a prescrição (salvo dos absolutamente incapazes) por iniciativa das partes, não mais atende a realidade surgida após o advento da Lei no.11.280/06. Também não é seguro o critério de que a decadência não comporta as causas de imunidade diante do preceito do art.207, do CC, que dispõe: “Salvo disposição legal em contrário, não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição.” (grifo nosso)

O critério topográfico adotado pelo Código Civil de 2002, da mesma forma, não apresenta segurança jurídica, seja para a doutrina, seja para os operadores do direito.

Neste contexto, Alves defende como solução do impasse o critério de distinção com base na análise concreta de cada caso pela adoção de um método indutivo-experimental, partindo-se do caso particular para o geral. Assim, disserta:

 

A partir daí , é possível a formulação aposteriorística do enunciado rigorosamente preciso de que na sistemática jurídica do Código Civil instituído pela Lei no. 10.406, de 10 de janeiro de 2002, se regem por prazos de prescrição todas as pretensões condenatórias, por prazos de caducidade todas as pretensões constitutivas diante de anulabilidade e não se submetem nem a prazos de prescrição nem a prazos de caducidade as pretensões declarativas. ( ALVES, 2008,p.33)

 

Anteriormente ao advento da Lei no.11.280, de 16 de fevereiro de 2006, em que pese as dificuldades na identificação de casos de prescrição e casos de decadência,  o Direito Material e Processual caminhavam juntos na mesma linha de pensamento .

O art.194, do Código Civil de 2002 expressamente exigia a iniciativa da parte para o conhecimento pelo julgador da prescrição, salvo o interesse de incapazes.

Foi suprimido nesta nova sistemática a expressão “ de direitos patrimoniais”, porquanto no novo Código Civil houve a expressa distinção entre casos de prescrição e caducidade.

Em harmonia com este entendimento o Código de Processo Civil, anteriormente ao advento da Lei no.11.280, de 16 de fevereiro de 2006,  dispunha no &5º., do art.219 ( BRASIL,2004):” Não se tratando de direitos patrimoniais, o juiz poderá, de ofício, conhecer da prescrição e decretá-la de imediato.”

Ou seja, pela redação inicial do art.219, &5º., do CPC  a prescrição de direitos não patrimoniais poderia ser decretada de ofício, porquanto eram casos típicos de decadência.

Existia, portanto, uma perfeita sintonia entre os dispositivos do Código de Processo Civil com os do Código Civil, todos no sentido de que a prescrição não poderia ser conhecida de ofício, não se tratando de objeção, mas de exceção substancial. Seguia-se a tradição de nosso direito quanto a este ponto.

 

 

3.2. EXCEÇÃO SUBSTANCIAL E OBJEÇÃO

 

 

A prescrição é matéria afeta ao direito civil, ou seja, ao direito material. Embora tenha por fundamento um interesse público -pacificação dos conflitos – não perde a sua natureza também privado, porquanto regula relações jurídicas entre particulares. Por esta razão defende-se a disponibilidade da prescrição.

Ao direito processual interessa os efeitos da prescrição na relação jurídica processual. Por tal razão admite-se que uma lei processual possa derrogar um dispositivo material no ponto relacionado ao aspecto processual, como o momento de argüição e a forma de conhecimento da prescrição.

Conforme explicitado é da tradição do direito processual incluir a prescrição como matéria de exceção substancial, defesa material indireta, implicando a sua argüição a resolução do processo, com julgamento do mérito, nos termos do art.269, inciso IV, do CPC, dando origem ao fenômeno da coisa julgada material.

Até o advento da Lei no.11.280, de 16 de fevereiro de 2006 existia perfeita harmonia entre a regulamentação da matéria no direito civil e no processual.

Contudo, diante da inovação da Lei no.11.280, de 16 de fevereiro de 2006, conferida a redação do art.219, &5º., do CPC, tornou-se relevante  para o presente estudo a distinção dos conceitos de exceção material e objeção.

Para a compreensão da diferenciação, oportuna a transcrição da lição dos eminentes Professores Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart ( 2007,p.132):

 

Defesas materiais indiretas. Aqui, a técnica utilizada pelo réu é diferente. Ao invés de abalar a pretensão do autor, simplesmente negando a ocorrência dos fatos que a sustenta ( ou a vinculação desses fatos com o pedido de tutela formulado na petição inicial), o réu alega fato novo, ampliando o conteúdo fático da demanda, fato este capaz de impedir ou modificar a realização do direito afirmado pelo autor, ou ainda extingui-lo. Deixa o réu, então, intacto o arcabouço fático que sustenta a pretensão do autor, mas apresenta outro fato, capaz de interferir naquele primeiro contexto, e que é chamado de extintivo, modificativo ou impeditivo. Na lição de Chiovenda, essa exceção ( em seu entender, e na visão da técnica mais apurada, a única exceção em sentido próprio) confere ao réu o poder jurídico de anular a específica ação proposta, mantendo, no mais, intacta a relação jurídica material com outras eventuais ações possíveis. Imagine-se, exemplificativamente, que, em uma ação de indenização ( derivada de acidente de veículo), o réu não se limitasse a negar a existência do dano ou de sua participação , mas alegasse a prescrição ( fato extintivo).

 

E, continuam na diferenciação dos institutos:

 

Finalmente, em outro sentido se pode utilizar o termo “exceção”. Emprega-se esse vocábulo para diferenciá-lo da objeção, quando se está a tratar de defesas sujeitas à argüição pela parte ( sob pena de o juízo não poder conhecer de tal matéria) e que , por essa específica razão, precluem, caso não sejam invocadas tempestivamente. As objeções, ao contrário, sãos as demais defesas, que não dependem de alegação da parte para serem conhecidas pelo juiz ( podem ser conhecidas de ofício pelo magistrado), não se sujeitando, por isso mesmo, à preclusão. (MARINONI; ARENHART2007,p.133).

 

Com idêntico entendimento escreve o jurista Nagib Slaibi Filho ( 2006,p.73):  

 

Existem, também, as exceções substanciais ou materiais, que se referem à questão de mérito mas que visam a demonstrar a inexistência do direito autoral ou, caso ele exista, de óbice decorrente de fato impeditivo, modificativo ou extintivo para sua eficácia. Tais exceções são a defesa prevista no art.326 do CPC, tendo, como exemplo, a exceção de retenção ( art.1.219, do CC), do contrato não cumprido ( exceptio non adimpleti contractus-CC,art.476), a alegação de prescrição (art.219,&5º., do CPC) etc. São chamadas de objeções as exceções de coisa julgada ( exceptio rei judicatae), de litispendência e de existência de compromisso arbitral, que podem ser conhecidas de ofício pelo juiz).

 

Conclui-se, portanto, que a prescrição como exceção substancial ou defesa material indireta deve ser alegada pela parte, não cabendo ao juízo o seu conhecimento de ofício. Está sujeita, desta forma, aos efeitos da preclusão processual. Como objeção deve ser conhecida de ofício pelo magistrado, deixando de se submeter aos efeitos da preclusão temporal. 

 

 

 3.3 DA RENÚNCIA

 

 

A renúncia caracteriza-se quando o titular de um bem, incorporado ao seu patrimônio, despoja-se do mesmo. Distingue-se da transação, porque esta pressupõe uma conversão de vontades de duas ou mais pessoas, ao passo que a renúncia é ato unilateral, exigindo a simples manifestação de vontade e o direito incontroverso do titular.  

Conceitua-a Leal (1978,p.49):

 

”Juridicamente , é o ato jurídico pelo qual o titular de um direito dele se despoja, por desistência expressa ou tácita. Ato dependente, exclusivamente, da vontade  do renunciante, sem necessidade de aprovação ou aceitação de terceiro, a renúncia é um ato unilateral.”

 

A renúncia da prescrição pressupõe, por conseguinte, em um ato de desistência pelo beneficiado, podendo ser expressa ou tácita.

Pressupondo a renúncia a existência de um direito, não se admite a renúncia de prescrição futura ainda não consumada até porque tal permissivo iria esvaziar a própria finalidade pública do instituto da prescrição afinal, antes mesmo da celebração de qualquer negócio jurídico, o beneficiado exigiria a renúncia prévia da prescrição futura.

 O art.161 do Código Civil de 1916 dispunha sobre a renúncia, declarando:

 

“Art.161. A renúncia da prescrição pode ser expressa , ou tácita, e só valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se consumar.Tácita é a renúncia, quando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição.”

   

O art.191, do Código Civil vigente também deu tratamento similar à matéria, dispondo:

 

“Art.191. A renúncia da prescrição pode ser expressa ou tácita, e só valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se consumar; tácita é a renúncia quando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição.”

 

A renúncia da prescrição para o texto legal pressupõe a sua consumação, não se admitindo a renúncia de prescrição futura.

Dissente deste entendimento o jurista Leal (1978). Para este é possível a renúncia no curso da prescrição, citando como exemplo o reconhecimento pelo prescribente do direito do credor, situação equiparada no texto legal como causa de interrupção da prescrição, constituindo típico caso de renúncia tácita de prescrição em curso.

 

Sobre a polêmica esclarece o jurista:

 

 O que o legislador teve em mente foi impedir a renúncia prévia de uma prescrição futura e essa proibição, portanto, não abrange a renúncia da parte já decorrida da prescrição em curso. Esta renúncia age sobre o passado, incidindo somente sobre o prazo transcorrido, nenhuma influência exercendo sobre o novo prazo que se inicia, após a interrupção. (LEAL,1978,p.52)

 

A renúncia é ato unilateral do prescribente, o qual se despoja do direito de não mais satisfazer uma obrigação a que estava sujeito. O cumprimento de uma obrigação prescrita é, portanto, um ato de liberalidade.

Pode ser ela expressa ou tácita. A expressa é quando o prescribente de forma inequívoca a manifesta. A tácita resulta da prática de ato incompatível com o reconhecimento da prescrição. A renúncia quando expressa não exige forma especial, podendo ser manifestada por escrito, por qualquer instrumento público ou privado, ou até verbalmente, ocasião em que será provada por testemunhas. A renúncia tácita requer a incompatibilidade entre o ato do prescribente e a prescrição, tal como o pagamento espontâneo de dívida prescrita.

Tratando-se de ato jurídico, a renúncia da prescrição requer a capacidade jurídica plena do prescribente. Exatamente por este motivo que se autoriza o conhecimento de ofício da prescrição envolvendo interesse de incapazes.

A renúncia também não pode causar prejuízo a terceiros, quando reduzido à insolvência o renunciante, porquanto se trata de mera liberalidade.

Questão intrigante é se a falta de alegação oportuna da prescrição se traduz em renúncia tácita da prescrição.

  Para Leal ( 1978) apenas quando a possibilidade de argüição se tornar inadmissível é que se poderia cogitar de renúncia tácita da prescrição.

A caracterização da renúncia tácita apresenta relevância após a Lei no.11.280/06, que permite o conhecimento de ofício da prescrição pelo juiz . Enquanto a prescrição era exceção, direito disponível, não havia maior relevância no momento da renúncia tácita. Agora, com a possibilidade do conhecimento de ofício da prescrição, questiona-se sobre a subsistência da renúncia, em especial a tácita.. O questionamento justifica-se pelo fato do art.191, do CC não ter sido revogado de forma expressa pela Lei processual, a exemplo do art.194, do CC. Residiria neste ponto uma aparente incongruência entre o ato jurídico da renúncia da prescrição e a possibilidade de conhecimento desta de ofício.

 

A solução para este conflito aparente de normas será abordada no próximo tópico.

 

     

3.4. PRESCRIÇÃO CONHECIMENTO JUDICIAL

 

 

A Lei no.11.280/06 foi  publicada em 16 de fevereiro de 2006, tendo um período de vacatio legis de noventa dias. Tratando de prescrição, dentre outras matérias, a sua aplicação, após o período de vacatio legis, foi imediata, atingindo os processos em curso.

A Lei Federal foi inserida no pacote de medidas para assegurar a efetividade do processo.

Relata Sérgio Pinto Martins (2006) a justificativa para o projeto de lei apresentado pelo Poder Executivo em 2004:

 

  Sob a perspectiva das diretrizes estabelecidas para a reforma da Justiça, faz-se necessária a alteração do sistema processual brasileiro com o escopo de conferir racionalidade e celeridade ao serviço de prestação jurisdicional, sem, contudo, ferir o direito ao contraditório e à ampla defesa.(...) No mesmo sentido, louvável a disposição que permite ao juiz decretar de ofício, sem necessidade de provocação das partes, a prescrição, em qualquer caso, conforme proposta de redação inédita ao &5º., do art.219, do CPC.

 

Destaca os termos do parecer do relator na Câmara dos Deputados, Deputado Maurício Rands ( PT):

 

 Igualmente conveniente é a norma do art.219, &5º., do CPC, que permite o reconhecimento ex officio da prescrição, ainda que se trate de direitos patrimoniais. O Código Civil , no art.194, ora revogado, já ampliava essa possibilidade quando a prescrição favorecesse o absolutamente incapaz, de forma que a doutrina entendia derrogado o referido &5º., do art.219, do CPC. Agora permite-se que o juiz reconheça, de ofício, a prescrição, independentemente da natureza dos direitos em litígio e da capacidade das partes. A providência é salutar, uma vez que, podendo a prescrição ser alegada em qualquer grau de jurisdição ( art.193, do Código Civil), não raro o seu reconhecimento tardio ocasionava a tramitação inócua do processo, gerando uma extinção do feito que poderia ter ocorrido muito antes ( art.269, IV, do CPC).

 

Também faz menção ao fundamento da aprovação do projeto no Senado, com a transcrição do parecer do senador Aloísio Mercadante:

 

  Quanto ao mérito, as alterações propostas merecem nosso apoio, uma vez  que seguem as diretrizes traçadas no Pacto de Estado em Favor de um Judiciário Rápido e Republicano, firmado por ilustres representantes desta Casa, da Câmara dos Deputados, do Poder Judiciário e do Poder Executivo. Nesse sentido, esta proposição vem no bojo de um grande esforço conjunto para a reformulação do nosso sistema de prestação jurisdicional, tornando-o mais célere e racional, sem, contudo, ferir os direitos e garantias dos jurisdicionados.(...) O projeto também altera o &5º., do art.219, do Código de Processo Civil, para fixar a regra geral que permite ao juiz conhecer da prescrição, independentemente de provocação das partes. Este dispositivo é complementado pela revogação do art.194 do Código Civil. Esta medida acabará com as restrições impostas ao conhecimento da prescrição, de ofício, pelo magistrado, contribuindo para a redução da morosidade processual, uma vez que impedirá a prática de atos desnecessários naquelas demandas em que o direito material controvertido já foi fulminado pela prescrição.  

 

A Lei Federal com o propósito de assegurar maior celeridade ao processo acabou causando verdadeira revolução, quando expressamente possibilitou ao magistrado o conhecimento da prescrição de ofício. Tentando buscar uma harmonia com o Código Civil, dada a própria origem material do instituto da prescrição, expressamente determinou, por natural incompatibilidade, a revogação do preceito do art.194, da Lei no.10.406, de 10 de janeiro de 2002, que apenas excepcionalmente permitia o conhecimento da prescrição de ofício pelo magistrado.

A revogação não conseguiu afastar a incongruência entre as normas civilistas e do processo civil. Isto porque o art.191, do Código Civil continuou em vigor, concedendo ao Réu, devedor, a faculdade de renunciar à prescrição consumada, de forma expressa ou tácita e o art.882, do mesmo diploma legal continuou a vedar que o devedor postulasse a devolução do valor pago por dívida prescrita.

De resto, a inovação contrariou de forma silenciosa toda uma tradição do sistema civilista.

Neste sentido opina Humberto Theodoro Júnior:

 

De fato, não há mais a regra expressa que proibia a iniciativa do juiz na espécie. Existe, porém, todo um sistema de direito material que não autoriza a imediata extinção do direito do credor ao termo final do prazo de prescrição; e que, ao contrário, preconiza sua sobrevivência sob a condição resolutiva do exercício da exceção de prescrição, deixado à livre disponibilidade do devedor. Em outras palavras: se cabe ao devedor renunciar à prescrição já consumada, de forma expressa ou tácita (art.191);se a parte a quem aproveita a prescrição ( o devedor) pode alegá-la ( por exceção) em qualquer grau de jurisdição (art.193); se o devedor não pode reaver o que houver pago para solver dívida prescrita ( art.882), a conclusão que se impõe é a de que o sistema do Código Civil está todo comprometido com a livre disponibilidade da prescrição consumada.  (2006,p.).

 

Para Júnior (2006) a inovação foi um grave equívoco ideológico da reforma, porquanto se imaginou que concedendo ao magistrado maiores poderes para velar pela rápida solução do litígio seria possível viabilizar a maior celeridade na resolução dos processos, com a extinção liminar de milhares de processos no seu nascedouro.

De acordo com Alexandre Freitas Câmara (2006), o que levou o legislador a essa modificação radical foi a tentativa de implementar maior celeridade e melhoria nos quadros estatísticos dos magistrados, além da própria defesa da Fazenda Pública, com a possibilidade de conhecimento pelo julgador de ofício das prescrições não alegadas pelos seus Procuradores.

Ambos, contudo, vislumbram a possibilidade da doutrina e da jurisprudência se insurgirem quanto à aplicabilidade de uma lei imprópria. Enquanto Humberto Theodoro Júnior defende a hipótese de inaplicabilidade da norma por uma interpretação sistemática e teológica do sistema, o jurista Alexandre Freitas Câmara defende a inconstitucionalidade da Lei, que a instituiu, ante a violação de vários princípios constitucionais, dentre os quais isonomia, adequação, segurança jurídica, devido processo legal, contraditório e liberdade de manifestação.

 

Divergindo destes posicionamentos, os juristas Flávio Cheim Jorge, Fredie Didier Jr. e Marcelo Abelha Rodrigues (2006) afirmam que a declaração da prescrição de ofício, autorizada pela Lei no.11.280/06, alterou tão somente o regramento processual da prescrição, não modificando a sua natureza de exceção substancial.

 Assim, a exceção apenas passou a ter regime jurídico de objeção. Advertem que a mudança foi uma questão de opção legislativa, tendo um cunho prático e não uma exigência teórica. Defendem a constitucionalidade da norma desde que o magistrado resguarde o direito ao contraditório, a exemplo do que ocorreu com a Lei no.11.051, que alterou a Lei de Execução Fiscal ( Lei Federal no.6830/80), permitindo o conhecimento de ofício da prescrição intercorrente pelo magistrado, desde que ouvida previamente a Fazenda Pública ( art.40, &4º.).

Apontam como solução para a conciliação das regras materiais dos arts.191 e 882, do CC-2002 com a processual do art.219, &5º., do CPC a oitiva prévia da parte Autora no indeferimento liminar da inicial. Como a decisão seria favorável ao Réu não haveria necessidade da sua oitiva prévia, não havendo afronta sob este enfoque do contraditório. Contudo, defendem que uma vez transitada em julgado a decisão que indeferiu a petição inicial com exame do mérito, o escrivão deverá comunicar ao réu o resultado desse julgamento ante aos efeitos da coisa julgada. Para eles, contudo, nada obstará o pagamento posterior da dívida pelo Réu, porquanto a renúncia à prescrição é direito disponível.

Quanto ao conhecimento da prescrição de ofício após o recebimento da defesa, considerando a aplicação imediata da norma processual, escrevem:

 

Após a apresentação da resposta pelo réu, o magistrado deve esperar a sua provocação. Se a matéria é disponível, não há sentido em conferir-se ao magistrado o poder de exercitar um direito pelo réu, que, estando em juízo e podendo exercê-lo, não o exerceu. A possibilidade de renúncia (expressa ou tácita) da prescrição também é um direito do demandado e deve, pois, ser respeitado. Seria excessivo poder de intervenção estatal na esfera privada, autoritarismo processual que não se pode admitir ( JORGE;JÚNIOR, 2006,p.41).

 

Vem a modificação do art.219, &5º., do CPV sofrendo duras críticas no que se refere à natureza de exceção da prescrição, de direito disponível. Assim, o juiz não poderia conhecê-la de ofício sem colisão frontal com os princípios constitucionais do contraditório ( art .5º., inciso LV, da CRFB/88)  e do devido processo legal ( art.5º., inciso , da CRFB/88) .

A solução sugerida pelos juristas Flávio Cheim Jorge, Fredie Didier Jr. e Marcelo Abelha Rodrigues embora adequada não tem previsão expressa no texto legal, que silenciou-se sobre o momento do pronunciamento da prescrição. A solução proposta, contudo, não eliminaria a instabilidade jurídica criada, porquanto as partes e advogados ficarão órfãos de decisões judiciais diferentes de acordo com o juízo de valor de cada magistrado em manifesto prejuízo a celeridade processual e com grande tumulto ao bom andamento processual.

De resto, estando o magistrado vinculado ao comando da norma não poderá deixar de aplicá-la sem que para tanto fundamente a sua decisão, seja trilhando o caminho da inconstitucionalidade através de um controle difuso, seja valendo-se de uma interpretação sistemática.

Ainda que, a exemplo da Lei Federal no.11.051, de dezembro de 2004, se possa adotar , por analogia, idêntico procedimento, as situações mostram-se diversas. Na Lei referida houve expressa menção a necessidade de oitiva prévia do credor. Certamente com o intuito de dar ciência ao magistrado das situações de fato relacionadas com a prescrição.

Embora cedo para a formação de uma sólida jurisprudência já existem julgados nos dois sentidos, acolhendo de ofício e previamente a prescrição e outros entendendo pela necessidade de oitiva prévia das partes sobre a matéria. Mesmo em matéria fiscal há distinção da declaração de ofício da prescrição com alicerce na Lei Federal nº11.051/04 ou com fundamento na norma genérica do art.219, &5º., do CPC, com a redação da Lei no.11.280/06.

 

 

 

4. CONCLUSÃO

 

 

 

No contexto de mudanças processuais, surgiu a Lei no.11.280/2006 com a promessa de tornar o processo mais célere e efetivo. Dentre as inúmeras modificações instrumentais introduzidas pela Lei relevante para o presente trabalho foi a que determinou a modificação do art.219, &5º., do CPC e a revogação do art.194, do Código Civil para permitir de forma genérica a declaração de ofício da prescrição pelo juiz. Anteriormente a esta Lei , o juiz apenas de forma excepcional poderia declarar a prescrição de ofício nos casos envolvendo direitos dos absolutamente incapazes.

 A discussão dos poderes do juiz para decretar de ofício a prescrição iniciou-se já com a própria redação original do art.194, do Código Civil de 2002, quando alguns doutrinadores passaram a entender pela derrogação da norma processual do art.219, &5º., do CPC de forma ampla.

Inobstante, apenas com a Lei no.11.280/2006 houve expressa previsão deste poder, conferido de forma ampla para os juízes. No Projeto da referida Lei ficou claro os ideais motivadores da mudança, os quais não guardavam nenhuma correlação com a evolução científica do instituto da prescrição, envolvendo questões de ordem prática. A modificação teve o intuito de solucionar com maior brevidade os processos com prescrição consumada.

A par desta finalidade, a mudança provocou acirrada discussão no meio jurídico. Juristas, como Humberto Theodoro Júnior e Alexandre Freitas da Câmara, defendendo a impropriedade e inaplicabilidade da norma por diferentes fundamentos e outros, como Flávio Cheim Jorge, Fredie Didier Jr. e Marcelo Abelha Rodrigues, a sua aplicabilidade desde que resguardada a prévia ciência do credor e posteriormente do devedor.

 Ainda é cedo para o exame da repercussão da inovação no meio jurídico, em que pese a existência de inúmeras decisões acolhendo, sem maiores delongas, o texto legal, com a aplicação pura e simples da letra fria da lei. O que se pode verificar no atual estágio é que dificilmente a inovação atingirá a finalidade estampada na justificativa do Projeto, considerando a celeuma instaurada em torno da constitucionalidade da norma, situação que contribuirá ainda mais para o retardo da entrega da prestação jurisdicional, com a multiplicação dos incidentes e recursos processuais, com enfoque primordial na questão processual e distanciamento ainda maior da verdadeira finalidade do processo.

Ademais, o clima de instabilidade jurídica tenderá a aumentar, com decisões divergentes em situações muitas vezes idênticas, com a quebra do princípio isonômico e com o agravamento da crise de credibilidade que a Justiça vem enfrentando.

 Ressalte-se, por fim, que questões constitucionais dificilmente têm rápida solução. . Enquanto isto assistiremos impávidos os efeitos nocivos de uma modificação desastrosa, quando em confronto com a real necessidade de sua alteração.

 


 

 

 

REFERÊNCIAS

 

 

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MATTIETTO

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TEIXEIRA, Welington Luzia Teixeira. A prescrição e a sua decretação de ofício pelo juiz. Revista Síntese no.65,maio/jun.2007.

 

VALÉRIO, J.N.Nargas. Decretação da prescrição de ofício- óbices jurídicos, políticos, sociais, lógicos, culturais e éticos. Revista Síntese no.62, nov./dez. de 2006.

 

VIEIRA, Sonia. Como Escrever uma Tese. 3ª ed., São Paulo: Editora Pioneira, 1996.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

ANEXOS


ANEXO A –

Presidência da República
 
Casa Civil
 
Subchefia   para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 11.280, DE 16 DE FEVEREIRO DE 2006.

 

Altera os arts. 112, 114, 154, 219, 253, 305, 322, 338, 489 e   555 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de   Processo Civil, relativos à incompetência relativa, meios eletrônicos,   prescrição, distribuição por dependência, exceção de incompetência, revelia,   carta precatória e rogatória, ação rescisória e vista dos autos; e revoga o   art. 194 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 -   Código Civil.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o Os arts. 112 e 114 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil, passam a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 112. ..................................................................

Parágrafo único. A nulidade da cláusula de eleição de foro, em contrato de adesão, pode ser declarada de ofício pelo juiz, que declinará de competência para o juízo de domicílio do réu." (NR)

"Art. 114. Prorrogar-se-á a competência se dela o juiz não declinar na forma do parágrafo único do art. 112 desta Lei ou o réu não opuser exceção declinatória nos casos e prazos legais." (NR)

Art. 2o O art. 154 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 154. ..................................................................

Parágrafo único. Os tribunais, no âmbito da respectiva jurisdição, poderão disciplinar a prática e a comunicação oficial dos atos processuais por meios eletrônicos, atendidos os requisitos de autenticidade, integridade, validade jurídica e interoperabilidade da Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP - Brasil." (NR)

Art. 3o O art. 219 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 219. ..................................................................

..................................................................

§ 5o O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição.

.................................................................." (NR)

Art. 4o O art. 253 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 253. ..................................................................

..................................................................

II - quando, tendo sido extinto o processo, sem julgamento de mérito, for reiterado o pedido, ainda que em litisconsórcio com outros autores ou que sejam parcialmente alterados os réus da demanda;

III - quando houver ajuizamento de ações idênticas, ao juízo prevento.

.................................................................." (NR)

Art. 5o O art. 305 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 305. ..................................................................

Parágrafo único. Na exceção de incompetência (art. 112 desta Lei), a petição pode ser protocolizada no juízo de domicílio do réu, com requerimento de sua imediata remessa ao juízo que determinou a citação." (NR)

Art. 6o O art. 322 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 322. Contra o revel que não tenha patrono nos autos, correrão os prazos independentemente de intimação, a partir da publicação de cada ato decisório.

Parágrafo único. O revel poderá intervir no processo em qualquer fase, recebendo-o no estado em que se encontrar." (NR)

Art. 7o O art. 338 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 338. A carta precatória e a carta rogatória suspenderão o processo, no caso previsto na alínea b do inciso IV do art. 265 desta Lei, quando, tendo sido requeridas antes da decisão de saneamento, a prova nelas solicitada apresentar-se imprescindível.

.................................................................." (NR)

Art. 8o O art. 489 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 489. O ajuizamento da ação rescisória não impede o cumprimento da sentença ou acórdão rescindendo, ressalvada a concessão, caso imprescindíveis e sob os pressupostos previstos em lei, de medidas de natureza cautelar ou antecipatória de tutela." (NR)

Art. 9o O art. 555 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 555. ..................................................................

..................................................................

§ 2o Não se considerando habilitado a proferir imediatamente seu voto, a qualquer juiz é facultado pedir vista do processo, devendo devolvê-lo no prazo de 10 (dez) dias, contados da data em que o recebeu; o julgamento prosseguirá na 1a (primeira) sessão ordinária subseqüente à devolução, dispensada nova publicação em pauta.

§ 3o No caso do § 2o deste artigo, não devolvidos os autos no prazo, nem solicitada expressamente sua prorrogação pelo juiz, o presidente do órgão julgador requisitará o processo e reabrirá o julgamento na sessão ordinária subseqüente, com publicação em pauta." (NR)

Art. 10. Esta Lei entra em vigor 90 (noventa) dias após a data de sua publicação.

Art. 11. Fica revogado o art. 194 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002, Código Civil.

Brasília, 16 de fevereiro de 2006; 185o da Independência e 118o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Márcio Thomaz Bastos

Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 17.2.2006

 

 ANEXO B -  JURISPRUDÊNCIA ( falta selecionar os principais acórdãos) 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

ANEXO B-

 

 

                                                                     

Presidência da República
 
Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI No 6.830, DE 22 DE SETEMBRO DE 1980.

 

Dispõe sobre a cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda   Pública, e dá outras providências.

        O PRESIDENTE DA REPÚBLICA: Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

        Art. 1º - A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil.

        Art. 2º - Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.

        § 1º - Qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei às entidades de que trata o artigo 1º, será considerado Dívida Ativa da Fazenda Pública.

        § 2º - A Dívida Ativa da Fazenda Pública, compreendendo a tributária e a não tributária, abrange atualização monetária, juros e multa de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato.

        § 3º - A inscrição, que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, será feita pelo órgão competente para apurar a liquidez e certeza do crédito e suspenderá a prescrição, para todos os efeitos de direito, por 180 dias, ou até a distribuição da execução fiscal, se esta ocorrer antes de findo aquele prazo.

        § 4º - A Dívida Ativa da União será apurada e inscrita na Procuradoria da Fazenda Nacional.

        § 5º - O Termo de Inscrição de Dívida Ativa deverá conter:

        I - o nome do devedor, dos co-responsáveis e, sempre que conhecido, o domicílio ou residência de um e de outros;

        II - o valor originário da dívida, bem como o termo inicial e a forma de calcular os juros de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato;

        III - a origem, a natureza e o fundamento legal ou contratual da dívida;

        IV - a indicação, se for o caso, de estar a dívida sujeita à atualização monetária, bem como o respectivo fundamento legal e o termo inicial para o cálculo;

        V - a data e o número da inscrição, no Registro de Dívida Ativa; e

        VI - o número do processo administrativo ou do auto de infração, se neles estiver apurado o valor da dívida.

        § 6º - A Certidão de Dívida Ativa conterá os mesmos elementos do Termo de Inscrição e será autenticada pela autoridade competente.

        § 7º - O Termo de Inscrição e a Certidão de Dívida Ativa poderão ser preparados e numerados por processo manual, mecânico ou eletrônico.

        § 8º - Até a decisão de primeira instância, a Certidão de Dívida Ativa poderá ser emendada ou substituída, assegurada ao executado a devolução do prazo para embargos.

        § 9º - O prazo para a cobrança das contribuições previdenciárias continua a ser o estabelecido no artigo 144 da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960.

        Art. 3º - A Dívida Ativa regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez.

        Parágrafo Único - A presunção a que se refere este artigo é relativa e pode ser ilidida por prova inequívoca, a cargo do executado ou de terceiro, a quem aproveite.

        Art. 4º - A execução fiscal poderá ser promovida contra:

        I - o devedor;

        II - o fiador;

        III - o espólio;

        IV - a massa;

        V - o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado; e

        VI - os sucessores a qualquer título.

        § 1º - Ressalvado o disposto no artigo 31, o síndico, o comissário, o liquidante, o inventariante e o administrador, nos casos de falência, concordata, liquidação, inventário, insolvência ou concurso de credores, se, antes de garantidos os créditos da Fazenda Pública, alienarem ou derem em garantia quaisquer dos bens administrados, respondem, solidariamente, pelo valor desses bens.

        § 2º - À Dívida Ativa da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam-se as normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial.

        § 3º - Os responsáveis, inclusive as pessoas indicadas no § 1º deste artigo, poderão nomear bens livres e desembaraçados do devedor, tantos quantos bastem para pagar a dívida. Os bens dos responsáveis ficarão, porém, sujeitos à execução, se os do devedor forem insuficientes à satisfação da dívida.

        § 4º - Aplica-se à Dívida Ativa da Fazenda Pública de natureza não tributária o disposto nos artigos 186 e 188 a 192 do Código Tributário Nacional.

        Art. 5º - A competência para processar e julgar a execução da Dívida Ativa da Fazenda Pública exclui a de qualquer outro Juízo, inclusive o da falência, da concordata, da liquidação, da insolvência ou do inventário.

        Art. 6º - A petição inicial indicará apenas:

        I - o Juiz a quem é dirigida;

        II - o pedido; e

        III - o requerimento para a citação.

        § 1º - A petição inicial será instruída com a Certidão da Dívida Ativa, que dela fará parte integrante, como se estivesse transcrita.

        § 2º - A petição inicial e a Certidão de Dívida Ativa poderão constituir um único documento, preparado inclusive por processo eletrônico.

        § 3º - A produção de provas pela Fazenda Pública independe de requerimento na petição inicial.

        § 4º - O valor da causa será o da dívida constante da certidão, com os encargos legais.

        Art. 7º - O despacho do Juiz que deferir a inicial importa em ordem para:

        I - citação, pelas sucessivas modalidades previstas no artigo 8º;

        II - penhora, se não for paga a dívida, nem garantida a execução, por meio de depósito ou fiança;

        III - arresto, se o executado não tiver domicílio ou dele se ocultar;

        IV - registro da penhora ou do arresto, independentemente do pagamento de custas ou outras despesas, observado o disposto no artigo 14; e

        V - avaliação dos bens penhorados ou arrestados.

        Art. 8º - O executado será citado para, no prazo de 5 (cinco) dias, pagar a dívida com os juros e multa de mora e encargos indicados na Certidão de Dívida Ativa, ou garantir a execução, observadas as seguintes normas:

        I - a citação será feita pelo correio, com aviso de recepção, se a Fazenda Pública não a requerer por outra forma;

        II - a citação pelo correio considera-se feita na data da entrega da carta no endereço do executado, ou, se a data for omitida, no aviso de recepção, 10 (dez) dias após a entrega da carta à agência postal;

        III - se o aviso de recepção não retornar no prazo de 15 (quinze) dias da entrega da carta à agência postal, a citação será feita por Oficial de Justiça ou por edital;

        IV - o edital de citação será afixado na sede do Juízo, publicado uma só vez no órgão oficial, gratuitamente, como expediente judiciário, com o prazo de 30 (trinta) dias, e conterá, apenas, a indicação da exeqüente, o nome do devedor e dos co-responsáveis, a quantia devida, a natureza da dívida, a data e o número da inscrição no Registro da Dívida Ativa, o prazo e o endereço da sede do Juízo.

        § 1º - O executado ausente do País será citado por edital, com prazo de 60 (sessenta) dias.

        § 2º - O despacho do Juiz, que ordenar a citação, interrompe a prescrição.

        Art. 9º - Em garantia da execução, pelo valor da dívida, juros e multa de mora e encargos indicados na Certidão de Dívida Ativa, o executado poderá:

        I - efetuar depósito em dinheiro, à ordem do Juízo em estabelecimento oficial de crédito, que assegure atualização monetária;

        II - oferecer fiança bancária;

        III - nomear bens à penhora, observada a ordem do artigo 11; ou

        IV - indicar à penhora bens oferecidos por terceiros e aceitos pela Fazenda Pública.

        § 1º - O executado só poderá indicar e o terceiro oferecer bem imóvel à penhora com o consentimento expresso do respectivo cônjuge.

        § 2º - Juntar-se-á aos autos a prova do depósito, da fiança bancária ou da penhora dos bens do executado ou de terceiros.

        § 3º - A garantia da execução, por meio de depósito em dinheiro ou fiança bancária, produz os mesmos efeitos da penhora.

        § 4º - Somente o depósito em dinheiro, na forma do artigo 32, faz cessar a responsabilidade pela atualização monetária e juros de mora.

        § 5º - A fiança bancária prevista no inciso II obedecerá às condições pré-estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional.

        § 6º - O executado poderá pagar parcela da dívida, que julgar incontroversa, e garantir a execução do saldo devedor.

        Art. 10 - Não ocorrendo o pagamento, nem a garantia da execução de que trata o artigo 9º, a penhora poderá recair em qualquer bem do executado, exceto os que a lei declare absolutamente impenhoráveis.

        Art. 11 - A penhora ou arresto de bens obedecerá à seguinte ordem:

        I - dinheiro;

        II - título da dívida pública, bem como título de crédito, que tenham cotação em bolsa;

        III - pedras e metais preciosos;

        IV - imóveis;

        V - navios e aeronaves;

        VI - veículos;

        VII - móveis ou semoventes; e

        VIII - direitos e ações.

        § 1º - Excepcionalmente, a penhora poderá recair sobre estabelecimento comercial, industrial ou agrícola, bem como em plantações ou edifícios em construção.

        § 2º - A penhora efetuada em dinheiro será convertida no depósito de que trata o inciso I do artigo 9º.

        § 3º - O Juiz ordenará a remoção do bem penhorado para depósito judicial, particular ou da Fazenda Pública exeqüente, sempre que esta o requerer, em qualquer fase do processo.

        Art. 12 - Na execução fiscal, far-se-á a intimação da penhora ao executado, mediante publicação, no órgão oficial, do ato de juntada do termo ou do auto de penhora.

        § 1º - Nas Comarcas do interior dos Estados, a intimação poderá ser feita pela remessa de cópia do termo ou do auto de penhora, pelo correio, na forma estabelecida no artigo 8º, incisos I e II, para a citação.

        § 2º - Se a penhora recair sobre imóvel, far-se-á a intimação ao cônjuge, observadas as normas previstas para a citação.

        § 3º - Far-se-á a intimação da penhora pessoalmente ao executado se, na citação feita pelo correio, o aviso de recepção não contiver a assinatura do próprio executado, ou de seu representante legal.

        Art. 13 - 0 termo ou auto de penhora conterá, também, a avaliação dos bens penhorados, efetuada por quem o lavrar.

        § 1º - Impugnada a avaliação, pelo executado, ou pela Fazenda Pública, antes de publicado o edital de leilão, o Juiz, ouvida a outra parte, nomeará avaliador oficial para proceder a nova avaliação dos bens penhorados.

        § 2º - Se não houver, na Comarca, avaliador oficial ou este não puder apresentar o laudo de avaliação no prazo de 15 (quinze) dias, será nomeada pessoa ou entidade habilitada a critério do Juiz.

        § 3º - Apresentado o laudo, o Juiz decidirá de plano sobre a avaliação.

        Art. 14 - 0 Oficial de Justiça entregará contrafé e cópia do termo ou do auto de penhora ou arresto, com a ordem de registro de que trata o artigo 7º, inciso IV:

        I - no Ofício próprio, se o bem for imóvel ou a ele equiparado;

        II - na repartição competente para emissão de certificado de registro, se for veículo;

        III - na Junta Comercial, na Bolsa de Valores, e na sociedade comercial, se forem ações, debênture, parte beneficiária, cota ou qualquer outro título, crédito ou direito societário nominativo.

        Art. 15 - Em qualquer fase do processo, será deferida pelo Juiz:

        I - ao executado, a substituição da penhora por depósito em dinheiro ou fiança bancária; e

        II - à Fazenda Pública, a substituição dos bens penhorados por outros, independentemente da ordem enumerada no artigo 11, bem como o reforço da penhora insuficiente.

        Art. 16 - O executado oferecerá embargos, no prazo de 30 (trinta) dias, contados:

        I - do depósito;

        II - da juntada da prova da fiança bancária;

        III - da intimação da penhora.

        § 1º - Não são admissíveis embargos do executado antes de garantida a execução.

        § 2º - No prazo dos embargos, o executado deverá alegar toda matéria útil à defesa, requerer provas e juntar aos autos os documentos e rol de testemunhas, até três, ou, a critério do juiz, até o dobro desse limite.

        § 3º - Não será admitida reconvenção, nem compensação, e as exceções, salvo as de suspeição, incompetência e impedimentos, serão argüidas como matéria preliminar e serão processadas e julgadas com os embargos.

        Art. 17 - Recebidos os embargos, o Juiz mandará intimar a Fazenda, para impugná-los no prazo de 30 (trinta) dias, designando, em seguida, audiência de instrução e julgamento.

        Parágrafo Único - Não se realizará audiência, se os embargos versarem sobre matéria de direito, ou, sendo de direito e de fato, a prova for exclusivamente documental, caso em que o Juiz proferirá a sentença no prazo de 30 (trinta) dias.

        Art. 18 - Caso não sejam oferecidos os embargos, a Fazenda Pública manifestar-se-á sobre a garantia da execução.

        Art. 19 - Não sendo embargada a execução ou sendo rejeitados os embargos, no caso de garantia prestada por terceiro, será este intimado, sob pena de contra ele prosseguir a execução nos próprios autos, para, no prazo de 15 (quinze) dias:

        I - remir o bem, se a garantia for real; ou

        II - pagar o valor da dívida, juros e multa de mora e demais encargos, indicados na Certidão de Divida Ativa pelos quais se obrigou se a garantia for fidejussória.

        Art. 20 - Na execução por carta, os embargos do executado serão oferecidos no Juízo deprecado, que os remeterá ao Juízo deprecante, para instrução e julgamento.

        Parágrafo Único - Quando os embargos tiverem por objeto vícios ou irregularidades de atos do próprio Juízo deprecado, caber-lhe -á unicamente o julgamento dessa matéria.

        Art. 21 - Na hipótese de alienação antecipada dos bens penhorados, o produto será depositado em garantia da execução, nos termos previstos no artigo 9º, inciso I.

        Art. 22 - A arrematação será precedida de edital, afixado no local de costume, na sede do Juízo, e publicado em resumo, uma só vez, gratuitamente, como expediente judiciário, no órgão oficial.

        § 1º - O prazo entre as datas de publicação do edital e do leilão não poderá ser superior a 30 (trinta), nem inferior a 10 (dez) dias.

        § 2º - O representante judicial da Fazenda Pública, será intimado, pessoalmente, da realização do leilão, com a antecedência prevista no parágrafo anterior.

        Art. 23 - A alienação de quaisquer bens penhorados será feita em leilão público, no lugar designado pelo Juiz.

        § 1º - A Fazenda Pública e o executado poderão requerer que os bens sejam leiloados englobadamente ou em lotes que indicarem.

        § 2º - Cabe ao arrematante o pagamento da comissão do leiloeiro e demais despesas indicadas no edital.

        Art. 24 - A Fazenda Pública poderá adjudicar os bens penhorados:

        I - antes do leilão, pelo preço da avaliação, se a execução não for embargada ou se rejeitados os embargos;

        II - findo o leilão:

        a) se não houver licitante, pelo preço da avaliação;

        b) havendo licitantes, com preferência, em igualdade de condições com a melhor oferta, no prazo de 30 (trinta) dias.

        Parágrafo Único - Se o preço da avaliação ou o valor da melhor oferta for superior ao dos créditos da Fazenda Pública, a adjudicação somente será deferida pelo Juiz se a diferença for depositada, pela exeqüente, à ordem do Juízo, no prazo de 30 (trinta) dias.

        Art. 25 - Na execução fiscal, qualquer intimação ao representante judicial da Fazenda Pública será feita pessoalmente.

        Parágrafo Único - A intimação de que trata este artigo poderá ser feita mediante vista dos autos, com imediata remessa ao representante judicial da Fazenda Pública, pelo cartório ou secretaria.

        Art. 26 - Se, antes da decisão de primeira instância, a inscrição de Divida Ativa for, a qualquer título, cancelada, a execução fiscal será extinta, sem qualquer ônus para as partes.

        Art. 27 - As publicações de atos processuais poderão ser feitas resumidamente ou reunir num só texto os de diferentes processos.

        Parágrafo Único - As publicações farão sempre referência ao número do processo no respectivo Juízo e ao número da correspondente inscrição de Dívida Ativa, bem como ao nome das partes e de seus advogados, suficientes para a sua identificação.

        Art. 28 - 0 Juiz, a requerimento das partes, poderá, por conveniência da unidade da garantia da execução, ordenar a reunião de processos contra o mesmo devedor.

        Parágrafo Único - Na hipótese deste artigo, os processos serão redistribuídos ao Juízo da primeira distribuição.

        Art. 29 - A cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, concordata, liquidação, inventário ou arrolamento

        Parágrafo Único - O concurso de preferência somente se verifica entre pessoas jurídicas de direito público, na seguinte ordem:

        I - União e suas autarquias;

        II - Estados, Distrito Federal e Territórios e suas autarquias, conjuntamente e pro rata;

        III - Municípios e suas autarquias, conjuntamente e pro rata.

        Art. 30 - Sem prejuízo dos privilégios especiais sobre determinados bens, que sejam previstos em lei, responde pelo pagamento da Divida Ativa da Fazenda Pública a totalidade dos bens e das rendas, de qualquer origem ou natureza, do sujeito passivo, seu espólio ou sua massa, inclusive os gravados por ônus real ou cláusula de inalienabilidade ou impenhorabilidade, seja qual for a data da constituição do ônus ou da cláusula, excetuados unicamente os bens e rendas que a lei declara absolutamente impenhoráveis.

        Art. 31 - Nos processos de falência, concordata, liquidação, inventário, arrolamento ou concurso de credores, nenhuma alienação será judicialmente autorizada sem a prova de quitação da Dívida Ativa ou a concordância da Fazenda Pública.

        Art. 32 - Os depósitos judiciais em dinheiro serão obrigatoriamente feitos:

        I - na Caixa Econômica Federal, de acordo com o Decreto-lei nº 1.737, de 20 de dezembro de 1979, quando relacionados com a execução fiscal proposta pela União ou suas autarquias;

        II - na Caixa Econômica ou no banco oficial da unidade federativa ou, à sua falta, na Caixa Econômica Federal, quando relacionados com execução fiscal proposta pelo Estado, Distrito Federal, Municípios e suas autarquias.

        § 1º - Os depósitos de que trata este artigo estão sujeitos à atualização monetária, segundo os índices estabelecidos para os débitos tributários federais.

        § 2º - Após o trânsito em julgado da decisão, o depósito, monetariamente atualizado, será devolvido ao depositante ou entregue à Fazenda Pública, mediante ordem do Juízo competente.

        Art. 33 - O Juízo, do Oficio, comunicará à repartição competente da Fazenda Pública, para fins de averbação no Registro da Dívida Ativa, a decisão final, transitada em julgado, que der por improcedente a execução, total ou parcialmente.

        Art. 34 - Das sentenças de primeira instância proferidas em execuções de valor igual ou inferior a 50 (cinqüenta) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTN, só se admitirão embargos infringentes e de declaração.

        § 1º - Para os efeitos deste artigo considerar-se-á o valor da dívida monetariamente atualizado e acrescido de multa e juros de mora e de mais encargos legais, na data da distribuição.

        § 2º - Os embargos infringentes, instruídos, ou não, com documentos novos, serão deduzidos, no prazo de 10 (dez) dias perante o mesmo Juízo, em petição fundamentada.

        § 3º - Ouvido o embargado, no prazo de 10 (dez) dias, serão os autos conclusos ao Juiz, que, dentro de 20 (vinte) dias, os rejeitará ou reformará a sentença.

        Art. 35 - Nos processos regulados por esta Lei, poderá ser dispensada a audiência de revisor, no julgamento das apelações.

        Art. 36 - Compete à Fazenda Pública baixar normas sobre o recolhimento da Dívida Ativa respectiva, em Juízo ou fora dele, e aprovar, inclusive, os modelos de documentos de arrecadação.

        Art. 37 - O Auxiliar de Justiça que, por ação ou omissão, culposa ou dolosa, prejudicar a execução, será responsabilizado, civil, penal e administrativamente.

        Parágrafo Único - O Oficial de Justiça deverá efetuar, em 10 (dez) dias, as diligências que lhe forem ordenadas, salvo motivo de força maior devidamente justificado perante o Juízo.

        Art. 38 - A discussão judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública só é admissível em execução, na forma desta Lei, salvo as hipóteses de mandado de segurança, ação de repetição do indébito ou ação anulatória do ato declarativo da dívida, esta precedida do depósito preparatório do valor do débito, monetariamente corrigido e acrescido dos juros e multa de mora e demais encargos.

        Parágrafo Único - A propositura, pelo contribuinte, da ação prevista neste artigo importa em renúncia ao poder de recorrer na esfera administrativa e desistência do recurso acaso interposto.

        Art. 39 - A Fazenda Pública não está sujeita ao pagamento de custas e emolumentos. A prática dos atos judiciais de seu interesse independerá de preparo ou de prévio depósito.

        Parágrafo Único - Se vencida, a Fazenda Pública ressarcirá o valor das despesas feitas pela parte contrária.

        Art. 40 - O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição.

        § 1º - Suspenso o curso da execução, será aberta vista dos autos ao representante judicial da Fazenda Pública.

        § 2º - Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o arquivamento dos autos.

        § 3º - Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução.

        § 4o Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato. (Incluído pela Lei nº 11.051, de 2004)

        Art. 41 - O processo administrativo correspondente à inscrição de Dívida Ativa, à execução fiscal ou à ação proposta contra a Fazenda Pública será mantido na repartição competente, dele se extraindo as cópias autenticadas ou certidões, que forem requeridas pelas partes ou requisitadas pelo Juiz ou pelo Ministério Público.

        Parágrafo Único - Mediante requisição do Juiz à repartição competente, com dia e hora previamente marcados, poderá o processo administrativo ser exibido na sede do Juízo, pelo funcionário para esse fim designado, lavrando o serventuário termo da ocorrência, com indicação, se for o caso, das peças a serem trasladadas.

        Art. 42 - Revogadas as disposições em contrário, esta Lei entrará em vigor 90 (noventa) dias após a data de sua publicação.

        Brasília, 22 de setembro de 1980; 159º da Independência e 92º da República.

JOÃO FIGUEIREDO
Ibrahim Abi-Ackel
Ernane Galvêas
Hélio Beltrão

Este texto não substitui o publicado no D.O.U de 24.9.1980

 

 

 

 

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